O caos

O mundo nos dá uma certeza e só uma: nada é certo.

No século XIII o Japão estava prestes a ser conquistado pelo império mongol. Os invasores eram muito superiores, mas uma tempestade inesperada destruiu a frota mongol e o Japão se salvou. Como se não bastasse, os mongóis planejaram uma nova invasão, quatro vezes maior do que a primeira, até que... um tufão arrasou a frota mongol. Kamikaze, "vento divino" como dizem os japoneses. Deus escolhe lados - ou pelo menos é como os vencedores gostam de contar a história.

Verdade ou não, seja por vento divino ou por braço humano, a história é cheia desses acontecimentos improváveis que mudaram o destino do mundo. A história é o laboratório de experiências do caos. O bater de asas numa borboleta no Brasil desencadeia uma série de eventos que causam um tufão que salva um país de uma guerra. É virtualmente impossível medir o impacto que o menor gesto do menor ser vai causar em toda a cadeia de causa e efeito. Eventualmente a corda pode arrebentar do lado mais forte.

Levemos as improbabilidades ao extremo e pensemos nas chances de estarmos vivos, de existir algo. Alguns criacionistas, obcecados em tentar provar a existência de um designer universal, já calcularam as chances de acontecerem os processos químicos que fizeram a vida surgir. A resposta era óbvia, a existência da vida é absurdamente improvável. Desperdício de energia! Não é óbvio que a existência é, mais que improvável, é impossível? Como pode surgir alguma coisa do nada? E se houver um criador, como pode este ter surgido do nada? Ou ter sempre existido? Não é igualmente absurdo? Andamos em círculos...

É inimaginavelmente improvável que exista alguma coisa ao invés do mais absoluto nada. Só pelo absurdo da existência, as chances da vida surgir espontaneamente são irrelevantes. Além disso, as outras possibilidades devem ser igualmente improváveis. Bom, já que o mundo existe, alguma dessas improbabilidades deveria ter acontecido, e se pensarmos numa escala de tempo grande demais, então a maioria delas já aconteceu em algum momento. Portanto, parabéns para nós que fomos contemplados na loteria universal.

A vida é absurda, mas ignoramos isso no cotidiano e fazemos nossos pequenos planos de macacos com nossas pequenas certezas de macacos. Necessidade de sobrevivência dizem os biólogos. Os primatas que ficavam muito tempo se perguntando quais as chances de um predador ser uma mera projeção de sua consciência provavelmente não deixaram herdeiros. Somos filhos dos pragmáticos. Nos achamos o centro de tudo. Construímos sistemas inteiros de pensamento considerando que somos a coisa mais magnífica que existe. Nesse momento já caímos na pegadinha do malandro. Do Serginho Malandro onipotente: o caos.

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