A sociedade humana funciona mais ou menos assim: primeiro, exploramos recursos do ambiente (fontes de energia, alimentos, matérias-primas) indispensáveis para a vida. Depois, esses recursos e os produtos advindos de sua manipulação são distribuídos. Essa distribuição se dá através da troca desses produtos por uma unidade simbólica de valor chamada dinheiro. O dinheiro é um pedaço de papel, ou um arquivo num computador que equivale simbolicamente aquilo pelo qual ele é trocado. Os seres humanos desprovidos de dinheiro precisam se vender em ordem de conseguir dinheiro para trocar por recursos para satisfazer suas necessidades.
Não bastassem as suas muitas necessidades naturais, o ser humano em sociedade cria necessidades artificiais, que os fazem precisar se vender ainda mais para satisfazer essas "necessidades desnecessárias". Quem não se vende mora na rua e é queimado vivo por neonazistas enquanto dorme.
Algumas pessoas possuem mais dinheiro que as outras. São elas que compram as demais pessoas e as colocam para exercer funções em seu nome. São elas também que tem o domínio da exploração dos recursos do ambiente. Essas pessoas criaram uma associação para defender seus interesses, sua propriedade e seu dinheiro. A associação se chama Estado.
O Estado é regido por leis, a lei é a língua oficial do Estado. Quem não cumpre essas leis é trancado em algum lugar, a menos que seja relacionado a algum dono do Estado, nesse caso, você pode atropelar quantos ciclistas quiser, portar toneladas de pasta-base de cocaína e infinitas garrafas de pinho-sol. As leis são criadas por políticos, que recebem votos das pessoas para conseguirem seus cargos. A maioria dos políticos ou são grandes associados do Estado, ou recebem dinheiro deles.
Em algum momento da história, o povo comum, que é obrigado a se vender, conseguiu conquistar direitos do Estado. Isso quer dizer que o Estado passou a ter a obrigação de lhes proporcionar bem-estar. Desde então, os donos do Estado advogam que deve haver menos Estado.
Um jeito fácil de ser eleito a ocupar um cargo no Estado é acreditar em Deus. Deus é uma abstração que o ser humano criou para responder qualquer questão desagradável para quem tem poder. Exemplo: por que alguns controlam tudo e alguns tem que se vender por dinheiro? Resposta: porque Deus quis.
As pessoas que acreditam em Deus se reúnem em igrejas. A maioria das pessoas que administram as igrejas são ricas; a maiorias das pessoas que acreditam em Deus são pobres. As igrejas dizem aos seus fiéis que as pessoas que querem acabar com o Estado dos donos dos recursos são maus e comem criancinhas. Muitos ministros dessas igrejas comem criancinhas de fato.
Antes do Estado existir, eram as igrejas que criavam as leis. Atualmente, a lei diz que Estado e Igreja não se misturam, porém as igrejas exercem grande influência no Estado. Antigamente, esse tipo de relação promíscua era tipificada na lei como adultério, e era crime. As igrejas eram as principais opositoras do adultério.
Apesar de não ser mais crime, muitos indivíduos que se vendem por dinheiro matam-se uns aos outros por descobrir que seus parceiros cometeram adultério. Também matam-se uns aos outros para conseguir dinheiro e trocar por recursos que são controlados por um grupo que criou uma associação chamada Estado. O Estado prende essas pessoas que se matam umas às outras, a menos que elas controlem recursos.
As igrejas dizem que, certa feita, Deus desceu à Terra para tentar resolver essa situação toda. Foi a única vez que os que se vendem por dinheiro, os donos do dinheiro e as igrejas se uniram: mataram Deus.
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Obviamente, este texto foi parcialmente influenciado pela linguagem descritiva cínica do curta-metragem genial de Jorge Furtado, Ilha das flores, de 1989. Também obviamente, este texto se desenvolve de maneira muito diferente, muito mais apressada, e muito menos genial.
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