Punheta. É uma palavra engraçada. Na verdade, me parece que todas as palavras usadas para designar essa atividade soam algo engraçadas: Masturbação, siririca, cinco contra um, descabelar o palhaço, tocar uma. São como improvisos para uma coisa que não se quer muito verbalizar - a saída é a comédia. É parecido com o que acontece com os nomes do Diabo: Sete-peles, Pata-rachada, Chifrudo, Mochila de criança, O Cão, Michel Temer.
O fato é que, das coisas mais cotidianas da vida humana, provavelmente a punheta está entre as menos debatidas. Pelo contrário, é normalmente tratada como algo proibido, místico, vergonhoso. Bom, pelo menos nos espaços públicos ou "familiares" e, principalmente, na educação feminina. Outro dia, uma amiga de 18 anos parecia estarrecida ao ouvir, em uma conversa em grupo, sobre as possibilidades da masturbação feminina. "Como assim, é realmente possível?! E a gente sente alguma coisa?! Meu Deus!". É o pós-capitalismo, minha gente.
Nos espaços reservados ao masculino, entretanto, falar de punheta, bem como batê-la, é algo tão comum quanto respirar. Só que respirar escondido num quarto escuro, assistindo pornô, ou, cada vez menos, no banheiro, pensando em alguém, em alguma situação fantasiosa ou lembrança. No tempo de minha aurora ainda haviam as revistas, agora elas são apenas uma memória distante, indiferente e os smartphones deram o golpe final nessa já carcomida e débil indústria.
Indo não-tão-direto ao assunto, o que eu quero falar é sobre a experiência masculina nesse universo masturbatório. Mais propriamente, minha própria experiência, usando-a como um periscópio para as demais. E esse relato savage já começa com um dado que pode parecer chocante, pelo menos para aquelas crianças que foram um pouco mais protegidas de nossa querida realidade social brasileira™ pelos pais: eu nem me lembro de quando comecei a bater punheta. Talvez desde que meu pau pudesse endurecer, talvez até antes. Pior, mas que precisa ser dito, muitas vezes a exposição a essa... possibilidade de obtenção de prazer é introduzida de forma abusiva por algum parente ou conhecido mais velho. Ou no mínimo de forma bastante inapropriada, quando não traumática, como expondo crianças à pornografia muito precocemente. E por mais que os conservadores tendam a idealizar o modelo familiar tido como mais tradicional, é justamente através dele, fechado, autoritário, mistificador e, acima de tudo, mentiroso, que esses abusos na infância acontecem.
Pois bem, para além dessa coisa da bateção de punheta começar muito cedo e de maneiras - no mínimo - duvidosas (mais como imposição ou mimetismo dos mais velhos, irresponsáveis ou abusivos, do que como autodescoberta), voltemo-nos para o segundo elemento fundamental dessa equação: a pornografia. Esta é introduzida conjuntamente com a punheta (afinal, esta é sua função), de modo que passa a ser tão naturalizada na vida de um indivíduo quanto andar ou falar. A simbiose pornô/punheta é tão poderosa, que provavelmente uma não existiria sem a outra do jeito que as conhecemos. É a união dos mundos da sexualidade e do consumo no capitalismo.
O terceiro ponto dessa problemática é o vício. E nesse sentido eu realmente acho que devemos passar a tratar a pornografia/punheta como passaram a tratar o cigarro no início dos anos 90. Tentar fazer um adulto médio parar de assistir pornografia é como tentar fazer parar de fumar alguém que começou com 8 ou 9 anos de idade. Isso fora aquele papo sobre como a pornografia afeta a psicologia sexual masculina, ou sobre o horror que todos sabemos que é a indústria pornográfica e sua irmã siamesa, a indústria da prostituição. Essa porra vicia, e não é pouco. Socialização patriarcal infantil, consumo e vício, a tríade da desgraça sexual da contemporaneidade.
Claro que eu não sou contra a punheta, e, para a minha vergonha, ainda assisto pornografia. Mas às vezes assusta pensar como esse hábito é introduzido em nossas vidas e como a pornografia é introjetada junto. Não é por moralismo que eu digo tudo isso, é porque é claro e evidente que a indústria pornográfica é algo horrivelmente violento e não vale a pena financiar isso. É assustador pensar que estou viciado nessa porra desde antes de ter mais de um metro e cinquenta, desde antes de caírem todos os meus dentes de leite. A punheta, que tem o potencial de representar as maravilhas da independência sexual e auto-satisfação humanas, se torna uma engrenagem da pior máquina possível, um instrumento de abuso.
Eis a nona cruzada, que, provavelmente, também fracassará. |
Escrevo isso porque recentemente passei por um dos maiores períodos de minha vida consciente sem consumir pornografia: cerca de um mês. Calhou de acontecer quando a depressão bateu forte e minha libido praticamente morreu. Por isso associei as coisas e fui tentar bater uma como forma de tentar superar tudo isso. Ao me deparar com a pornografia tendo algum tipo de papel redentor na minha vida, a ficha caiu e percebi que eu era só mais um fumante acendendo um cigarro para fugir dos problemas. Não havia prazer real ou que valesse a pena. Pelo contrário, só auto-deterioração, principalmente de minha vida sexual. Afinal, o mundo real não é um filme pornô, para o terror do nosso cérebro que não é lá muito bom em distinguir as coisas. O real já não excita tanto.
Aquela tristeza pós-punheta, uma experiência que parece ser quase universal, não acontece à toa, nem deve ser reduzida a mera "culpa cristã". Nós sabemos que há algo errado sobre como a punheta é batida hoje em dia (que frase!). É um orgasmo triste. Tinha tudo para ser auto-realizador, para ser faustop, mas é triste. E é triste que seja triste. É uma grande auto-felação da tristeza nela mesma.
Caramba.
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