O fim da obra

Uma das coisas que eu percebo nas redes sociais é que não há a possibilidade de se constituir uma obra a partir delas. A linguagem da rede social é a do meme, e o meme depende completamente da conjuntura. A obra ultrapassa a conjuntura. E nem é porque a rede social foi criada para o meme conscientemente. A lógica da rede social criou o meme de forma orgânica. O meio condiciona o tipo de mensagem que mais se adapta às suas regras, em parte naturalmente, porque o público é quem cria o conteúdo, em parte condicionado pelas regras preestabelecidas da rede. A obra e a rede social são quase opostas. O blog, por exemplo, favorece muito mais a obra. Tem gente que escreve livros compostos unicamente de textos de seus blogs. Contos, crônicas, análises políticas, o blog abraça a narrativa curta, a emoldura. Já a rede social abraça o momento, o story potencializa esse efeito imediatista ao máximo. É bom também, mas não constitui obra. Não chega nem a ser um rizoma, do qual falavam aqueles franceses chatos pacaralho. É um monte de galho espalhado no chão.

O negócio é que parte da comunicação atual parece caminhar para o fim da obra. Passamos do culto à obra, dos clássicos, para um presente contínuo, alimentado por um fluxo sem fim de novos posts e stories. O clássico só tem utilidade enquanto exemplo de formula para ser reutilizada. Quem tinha obra para fazer, já fez. Agora já era. É muita gente fazendo muita coisa, tudo ao mesmo tempo. O que fica é um monte de fragmentos sobre a conjuntura. É o paraíso dos historiadores, principalmente os que tem que produzir incessantemente pela lógica neoliberal. É fonte para mais de metro. Eu, como sou um homem do meu tempo, estou completamente comprometido a não estabelecer uma obra. Cada vez mais, abraço o story. Cada vez mais fragmentado. Cada vez mais confuso. Um dia depois, tudo desaparece.

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